Venha compartilhar um pouco do trabalho que realizo como historiador e professor da cidade de Cotia. Mergulhe no passado das pessoas que construiram este lugar, recorde fatos marcantes que deram identidade cultural a esta cidade.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

“FACULDADE” VINÍCIUS DE MORAES: A ESCOLA COMO ESPAÇO DE TRANSFORMAÇÃO



Há muito tempo escrevi um texto  sobre a experiência que vivemos na Escola Estadual  Vinícius de Moraes. Ele se perdeu, pois ainda não existiam memória de computador e tantas outras facilidades para guardá-lo. Vou tentar reescrevê-lo, mas agora com a visão dos mais de trinta anos que se passaram.

Neste início de ano fui visitar alguns amigos de escola para colocar a conversa em dia e lembrar deste tempo. Unanimidade entre os visitados, a escola Vinicius de Moraes marcou e fez a diferença na nossa formação intelectual e profissional.

No começo da década de 80 formou-se ali um grupo de professores que viam com muita clareza a importância da formação do aluno cidadão. As aulas eram dinâmicas e sempre acompanhadas de temas da política, da cultura e da economia vinculados ao ensino de Matemática, História, Química e outras disciplinas. Aulas inesquecíveis!

O cenário que permeava a escola e o país no final da década de 70 e início de 80 era o da luta para a volta dos exilados, da greve no ABC, das comunidades de bases se organizando e tantos outros movimentos que se insurgiam contra os quase vinte anos de ditadura militar, implantada em 31 de Março de 1964. O diretor da escola, Santo dos Reis Siqueira, foi  uma peça importante nesta efervescência de atividades transformadoras. Lembro-me que ele tinha uma Belina bem surrada, e de vez em quando enchia o carro de alunos e os levava para participar de debates, palestras e discussões sobre a necessidade urgente do país se democratizar. E enquanto as outras escolas incentivavam a organização de centros cívicos, estruturamos um dos primeiros grêmios estudantis livres do Brasil. Existia uma certa desobediência civil...

Os desfiles de aniversário da cidade eram motivadores e inovadores, mas  nunca conseguimos  continuar até o final do evento. Explico o porquê. Num deles, recebemos um tema da prefeitura, que deveríamos desenvolver para mostrar as belezas de Fernando Noronha. Os alunos iniciaram o trabalho discutindo o tema sugerido a partir de uma pergunta: como se fazia para chegar a Fernando de Noronha? Na discussão apareceram coisas como de barco, de avião, de pedalinho (risos), só que para chegar a estes meios de transporte era preciso ônibus! Esta foi a deixa que precisávamos para trazer o assunto para a realidade do transporte público em Cotia, que naquela época já era ruim.

Toda a escola foi mobilizada para estruturar e organizar o desfile e muitos alunos se envolveram em tudo o que acontecia, até mesmo os indiferentes. De verdade: todos foram contagiados por aquela movimentação frenética, embora muitos alunos e alguns professores defendessem a ideia de que aula era aquela de conteúdo. Para mostrar a precariedade do transporte público em Cotia, montamos um ônibus e colocamos centenas de alunos dentro, como se estivessem em uma lata de sardinha, além de outras alegorias. Coisa mais linda ver quinhentos alunos acompanhando a música que escolhemos e a chegada na avenida, quando começaram a fazer evoluções como numa escola de samba. O batalhão de choque já estava ali impedindo nosso avanço e desviando os alunos para uma rua distante do evento. Por isso nunca chegamos ao final da festa. Mas valeu muito o aprendizado sobre cidadania e que a escola poderia ser um espaço transformador.

Num outro desfile adaptamos a música “Gente Humilde”, do Vinicius de Moraes, para retratar a precariedade da moradia na cidade. Também não chegamos ao final... em outra oportunidade trago esta história em detalhes.



Professor Marcos Roberto Bueno Martinez

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

CENTRO EDUCACIONAL: MUITO ALÉM DE UM DEPÓSITO DE CRIANÇAS


A Educação Infantil, que vai de 0 a 6 anos, começou a ser tratada como obrigação do Estado a partir da constituição de 1988, depois reforçada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, na década de 90. É uma história recente. Este reconhecimento legal veio com medidas orçamentárias, administrativas e pedagógicas. Foi um passo importante até então, pois a educação das crianças, e principalmente as “creches”, antes eram oferecidas e administradas por setores da igreja e associações filantrópicas. O que mudou com a obrigatoriedade do Estado em dar prioridade à Educação Infantil? Houve algumas mudanças, a passos de tartaruga, mas houve.  Para que hoje a falta de vagas  em centros educacionais deixasse de ser um problema, a união, os estados e os municípios teriam que ter feito a lição de casa. E não fizeram por falta de compromisso político com a população e, principalmente, ausência de planejamento.

Por outro lado, vagas em creches – atualmente diz-se “centro educacional” – devem existir não apenas para atender os filhos dos pais e mães que precisam trabalhar, mas principalmente porque a educação infantil é a etapa onde são dados os primeiros passos para a formação de um cidadão pleno. E, ainda antes disso, o Estado tem que garantir uma educação de saúde, com controle de natalidade e planejamento familiar.

Um outro olhar em relação aos centros educacionais é que eles não cuidam de crianças, eles educam. Têm que ser um espaço lúdico, arejado, aconchegante e prazeroso para todos que ali habitam, mas têm que ter como base um projeto pedagógico consistente. Todos os anos ouvimos discursos histéricos por vagas em creches, mas eles acabam se tornando estéreis, vazios, pois no próximo ano os mesmos problemas reaparecem sem solução. Estamos convictos de que a saída e as possíveis soluções desta questão não estão no proselitismo político.

É urgente que as leis constitucionais se cumpram e atendam à realidade e às necessidades da população. As estatísticas sobre a necessidade de vagas em educação infantil são imprecisas e carecem de uma abordagem técnica confiável. Assim, torna-se prioritário sabermos o número de vagas de que precisamos. Antes, porém, é fundamental que a união, os estados e os municípios façam e coloquem seus planos diretores em prática, para que estes não sejam apenas calhamaços de papel que “fazem de conta”, para tudo “continuar como dantes no quartel de Abrantes”. Talvez com um plano diretor sério, um plano municipal de educação e uma boa gestão pública, as lamentações em relação a falta de vagas, daqui a um tempo, sejam algo do passado. Quando o Ministério Público exige que o governo, em um determinado prazo resolva o problema de falta de vagas, está reforçando a ideia de que centro educacional é depósito de crianças. Não é. O Ministério Público poderia ajudar solicitando ações dos municípios no “atacado e não no varejo”, como por exemplo, definir qual é a política educacional que norteará a Educação Infantil, com quais objetivos, metas e resultados esperados, e acompanhar este processo em sua evolução. O buraco é mais embaixo.


Consultas:

Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988.
Estatuto da Criança e do Adolescente.
Revista “Direcional Educador”.
Carvalho, José Romero de: O brincar e a preparação para a alfabetização.



Professor Marcos Roberto Bueno Martinez

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

FOTOGRAFIA EM PRETO E BRANCO



Li que a Kodak está mal das pernas, à beira da falência. O motivo é que a empresa, que foi fundada em 1888, não acompanhou as mudanças do seu tempo. Mas deixa pra lá, não é sobre isso que quero escrever... quero escrever sobre a força da fotografia na nossa vida e o registro da nossa memória ali contido. Na semana passada vasculhei algumas caixas antigas, como muita gente faz, e reencontrei alguns álbuns de fotografias em preto e branco. Recordei de bons momentos.


 Crédito: Foto Votuporanga - Takeo Sato
Minha mãe, Aparecida Bueno Martinez, com 21 anos e eu com 5 meses.
Essa foto foi tirada em outubro de 1960.


Aqui no pé do ouvido: faça uma busca nas suas coisas antigas. Se não tiver nada, busque pelo menos na memória. Fazia muito tempo que não via essas fotos e me deu uma grande saudade das festas de aniversário, dos encontros dos tios, das tias, dos primos, e a presença forte dos meus avós. Revi gente que já tinha esquecido e outros que ainda são presentes. Matei a saudade. Mate a sua também.


 Crédito: Foto Votuporanga - Takeo Sato
Minha mãe e meu pai, José Molero Martinez. Foto tirada em 1964.
Eu tinha 4 anos, minha mãe 25, e meu pai 31 anos. 


Não acredito na máxima de quem gosta de coisa velha é museu. Nessa busca de lembrar o passado, além das fotografias encontrei meus primeiros rabiscos e uma caneta de pena que ganhei da minha tia. É normal também querermos apagar o passado, principalmente as coisas amargas, mas hoje vejo que os acontecimentos indesejáveis também servem para refletir e crescer. Essa coisa de bagagem, conteúdo, a gente vai adquirindo na medida em que visita e revisita a própria história.


Professor Marcos Roberto Bueno Martinez

AS ESGANADAS (JÔ SOARES)


Uma pequena nota:

Caronte, um impiedoso e cruel  assassino de mulheres gordas, pode estar muito perto de você. As Esganadas, livro escrito pelo humorista Jô Soares, recheia as páginas com mulheres gordas e lindas, que deixariam qualquer “anoréxica ambulante” com inveja. Ao abordar esse tema, Jô coloca os gordos e gordas em evidência, e com inteligência levanta a autoestima destes seres humanos que carregam todas as culpas do mundo. Gordo também é gente! (risos...) Gente gorda também é bonita e pode usar roupas charmosas e se arrumar como qualquer outra pessoa.

Caronte gostava de aliciar gordas jeitosas – um psicopata de bom gosto. A história é contextualizada no ano de 1938, na cidade do Rio de Janeiro. E é uma leitura deliciosa.

Ah! Você vai encontrar até Fernando Pessoa no desenrolar da trama.

Gordas e gordos, cuidado com os “carontes” que os rodeiam. (Risos...)

Professor Marcos Roberto Bueno Martinez

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

CONSTRUINDO O FUTURO


CENTRO EDUCACIONAL DA VILA SÃO FRANCISCO
(C. E. Ernesto Mendes da Silva)


 
 


Esta creche foi construída em um terreno abandonado, que servia para receber entulho e o movimento de pessoas desocupadas, situação que preocupava a vizinhança. A construção deste centro educacional tinha como objetivo principal atender às mães trabalhadoras do centro de Cotia. Ela foi inaugurada no dia 10 de abril de 2004.

Professor Marcos Roberto Bueno Martinez

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

COMPANHEIRA E GUERREIRA





O nosso carinho e respeito aqui de casa e um feliz aniversário, D. Lúcia Torrezani, e que a senhora continue abrilhantando as nossas vidas.

Uma singela homenagem através das palavras de Cora Coralina:





Um abraço da família.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

RESERVA FLORESTAL DO MORRO GRANDE EM PERIGO



(SUSTENTABILIDADE III)

“A indiferença com o meio ambiente é a conivência com a nossa destruição.”

 (Hans Alois Tschirner - 1949-2006) [1]


Pesquisadores dos departamentos de Ecologia e de Zoologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, do Instituto de Botânica e do Departamento do Patrimônio Genético da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente realizaram durante cinco anos estudos sobre a Reserva Florestal Do Morro Grande, pesquisa nunca feita até então. Produziram um  documento revelador sobre a fauna e a flora que habitam bem próximas aos nossos quintais e bem debaixo dos nossos narizes, e que há anos vêm sofrendo uma degradação impiedosa. O estudo realizado pelos pesquisadores  apresenta problemas e soluções para este pedaço da Mata Atlântica e precisamos de fato conhecer mais sobre a Reserva do Morro Grande para que este oásis verde seja preservado e explorado sabiamente pela comunidade local.

O documento intitulado Características ecológicas e implicações para a conservação da Reserva Florestal do Morro Grande [2] registra em seu levantamento mais de 13 mil indivíduos pertencentes a 673 espécies  de árvores, mamíferos não-voadores, aves, répteis, anuros (sapos, rãs e pererecas) e aranhas orbitelas (um tipo de aranha). 

  Represa das Graças

A América Latina Logística, mais conhecida como ALL, é uma empresa que atua na área da logística para o escoamento da produção rural através de ferrovias, que tem recebido diversas críticas nas regiões onde exerce suas atividades por descumprir normas do processo de privatização do qual participou. Inclusive está sendo investigada por uma comissão no Congresso, pelos senadores.
As irregularidades são muitas, mas o que a ALL tem a ver com a Reserva Florestal do Morro Grande? Uma parte da malha ferroviária passa pela reserva e o IBAMA autorizou a duplicação de 27 quilômetros da linha férrea até Embu-Guaçu. Como? Teve algum estudo do meio? Qual o impacto desta obra na reserva? Quais caminhos foram percorridos para a ALL receber essa autorização?

ALL recebe licença do Ibama para duplicação de ferrovia em São Paulo

Brasília (30/11/2011) – O Ibama emitiu autorização prévia referente ás obras de duplicação do  segmento ferroviário Itirapina até Embu-Guaçu. O trecho de 27 quilômetros é parte da ALL Malha Paulista. 
Após concluída, a obra propiciará o aumento da capacidade de escoamento da safra de soja e demais grãos do Mato Grosso ao Porto de Santos.

Ascom - Ibama


Para que algum interessado receba uma autorização do IBAMA para viabilizar seu projeto são exigidas três fases: a primeira fase é a “Licença Prévia”, depois a “Licença de Instalação”, e por último a “Licença de Operação”. Cada fase estabelece critérios bem definidos, e além disso, o projeto é remetido a órgãos ambientais para estudos e análises. A argumentação para a autorização da duplicação é até convincente: “para escoar soja e outros grãos do Estado do Mato Grosso ao Porto de Santos”. Será que essa autorização foi concedida pela força econômica que cerca estes grupos? Muita pressão! Mas a pergunta que não quer calar é: “Qual será o impacto ambiental na Reserva do Morro Grande?” Alguém pode responder? Para que não sejamos chamados de alarmistas e catastróficos é de bom senso lembrar que a reserva vem sofrendo agressões da comunidade em seu entorno há anos.

 Represa Pedro Beicht

A fiscalização deste território é realizada pela SABESP. São 10.873 hectares, que correspondem aproximadamente a 12 mil campos de futebol oficial. A comparação foi feita só para percebemos o patrimônio ambiental que temos. “En passant”, a fiscalização é precária, e devido à extensão da floresta os fiscais não conseguem evitar a presença de caçadores. Agora pasmem: animais exóticos são abandonados na reserva, ameaçando os moradores nativos! Será que a saída seria transformar a Reserva do Morro Grande em um parque? Há grande dúvida em relação a isso, mas de imediato é preciso evitar o crescimento populacional nas proximidades da floresta, e em conjunto com a comunidade e as instituições públicas viabilizar projetos que ao mesmo tempo gerem receita para o município e promovam cultura e educação no sentido de preservar esse patrimônio verde. É bom lembrar a uma parte dos moradores da cidade de São Paulo e da Grande São Paulo, que a água que chega nas suas torneiras vem dessa reserva, onde se localizam as represas Pedro Beicht e das Graças.


 
 SABESP – Estação de tratamento de água



FONTES:

. In-pacto Instituto Proteção Ambiental 
. Relatório do Senador Requião aprovando a comissão de inquérito sobre a Agência Nacional de Transportes Terrestres 
. Documento: Características ecológicas e implicações para a conservação da Reserva Florestal do Morro Grande 
   http://www.biotaneotropica.org.br/v6n2/pt/abstract?article+bn01006022006 


Professor Marcos Roberto Bueno Martinez


[1] Hans Alois Tschirner foi  um conhecido ambientalista da cidade de Cotia. Foi o fundador e primeiro presidente das ONGS In-Pacto e Isvapar.
[2] pg. 3 e 4